quarta-feira, 11 de março de 2020

Fé cristã e igualdade de gênero


8 de março celebra conquistas históricas das mulheres, que mudaram culturas e sociedades, sempre no sentido de mais humanização e bem-viver. Beneficiaram as crianças, a maternidade, a paternidade, a velhice, a educação, a saúde, enfim, a liberdade humana.
A fé cristã, por sua vez, defende a igualdade entre os gêneros, expressão dos desígnios do Criador, que fez mulher e homem “à sua imagem e semelhança”. O apóstolo Paulo explicou bem esse ponto na Carta aos Gálatas. Ele disse:
“De fato, todos vocês são filhos de Deus, por meio da fé em Jesus Cristo (...). Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo (...) herdeiros conforme a promessa.” (Gl 3, 26-29) E, mais adiante, ele explicou a “adoção”: “...Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido debaixo da Lei, a fim de resgatar os que estavam debaixo da Lei, de modo que recebêssemos a adoção de filhos. Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: ‘Abba! Pai’. Portanto, você já não é escravo, mas filho. E se você é filho, é também herdeiro por causa de Deus”. (Gl 4, 4-7)
O Evangelho anulou, portanto, toda discriminação, uma vez que através de Cristo fomos adotados. O teólogo Timothy Keller destacou que a adoção, na sociedade daquela época, era uma instituição masculina. Ela funcionava assim: um homem sem herdeiros podia adotar um para quem deixaria seus bens, nome e status social. Ocorre que, pela lei, só homens podiam ser adotados. Nunca uma mulher. Daí o caráter revolucionário da adoção que Deus ofereceu através de seu Filho, a pessoas de diferentes etnias, classe social e gêneros.
Nas nossas instituições humanas não tiramos todas as consequências desse Evangelho. Ao contrário, na construção das igrejas cristãs, houve perseguição e discriminação de mulheres. Na vida civil, a igualdade está longe! Vejam os índices de violência contra mulheres e homossexuais, as barreiras à mobilidade das mulheres nos espaços das cidades, a baixa representação política feminina, as dificuldades de conciliar trabalho e cuidados com os filhos e os idosos, o lugar secundário que as sociedades atribuem aos cuidados em geral. Questionam-se direitos como licença paternidade e maternidade. É difícil fazer valer o princípio da solidariedade. A sociedade é composta por pessoas diferentes em idade, sexo, em necessidades etc. A diferença nos enriquece e cada um tem a colaborar com o coletivo.
Por outro lado,os movimentos feministas inscreveram valores cristãos, seja na lei, seja nas relações interpessoais.
Há desacordos, como por exemplo, o tema do aborto, que movimentos feministas consideram um direito de escolha da mulher. Sem entrar nessa discussão, vale lembrar que há nesse terreno algumas concordâncias básicas: a maternidade, a infância, a educação, a saúde, a informação, são alvos fundamentais de uma sociedade, de um país que defende a justiça. Não adianta condenar o aborto e, ao mesmo tempo, ser indiferente à miséria, à falta de acesso a meios contraceptivos, à cultura, ao cuidado com as crianças, às necessidades das mães e dos pais etc...
Na visão da fé, mulheres e homens foram criados segundo um projeto de liberdade. Houve a queda, mas Jesus inaugurou os novos tempos escatológicos, nos fez Nova Criação. Deixou sua Palavra e nos redimiu na Cruz.
É possível afirmar que, na história da busca pelo Reino – “venha a nós o vosso Reino, seja feita a vossa vontade..., o pão nosso de cada dia” – os feminismos também estão presentes, a despeito de suas grandes diferenças e das discordâncias com elementos da fé cristã. Esses movimentos têm sua quota de participação na feitura do Reino que quebra as correntes do mundo. Lembrando Paulo: “... como podemos querer nos tornar novamente escravos...se conhecemos a Deus e nos tornamos herdeiros"?
Não se opõem feminismo e fé cristã. Feminismo é ferramenta na busca da equidade de gênero, do respeito às diferenças e da paz. Ele se alinha na longa lista de utopias de justiça que tantos povos e culturas formularam, imaginaram e buscaram.

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