quarta-feira, 25 de março de 2020

Quinta-feira

No calendário da Semana Santa, o que se celebra hoje, quinta-feira, é de um significado tão poderoso que sua realização plena transformaria nosso mundo, assim como a cada um de nós. É a instituição da eucaristia por Jesus, precedida pelo gesto de lavar os pés de seus amigos, quando disse o seguinte: Vocês entendem o que lhes tenho feito? Vocês me chamam 'o Mestre' e 'o Senhor'. E vocês têm razão, porque eu sou mesmo. Pois bem, se eu lavei os pés de vocês, eu que sou o Senhor e o Mestre, vocês também devem lavar os pés uns dos outros. (Jo, 13, 12-15)
Que concepção extraordinária de poder! Que projeto de sociedade! A pessoa mais importante, a que é Mestre e Senhor, é a que serve e ensina a servir. Poder, para nós, é tudo menos esse gesto!
Já se vão mais de dois milênios desde aquela Páscoa em torno de uma mesa farta, que comemorava a vitória da nossa vida sobre a morte e instituía a partilha e o serviço como nossas obrigações mais características.
O que significa para nós esta recomendação daquela Ceia: ...fazei isto em memória de mim!? Faze-lo, por certo nos tornaria beneficiários daquela felicidade permanente que tantos séculos vêm buscando alcançar! Uma vida plena para todos, a começar de hoje. Então, o que significa chama-lo Mestre, hoje? Essa lição, como ainda é difícil aprender!
Aos meus queridos amigos e amigas, com votos de Feliz Páscoa e um abraço fraterno! Que os significados tão ricos e plenos de vida de todos esses dias encham o coração e o lar de cada um. Que encham também meu coração, que tantas vezes duvido, me afasto dessa herança e dessa fonte renovada de alegria..

domingo, 22 de março de 2020

Enquanto as coisas falam


Coisas sempre significam mais do que parecem.
Entre os múltiplos significados,
Sua capacidade de falar de amor.
O que podem dizer de um ser amado?
Que memórias conseguem reviver?
Há primeiro, os grandes objetos,
Dos grandes olhares, as paisagens,
Horizonte, mar, lua, verdes, casas ao longe...
Os que evocam os momentos grandes,
E os grandes sonhos dos amantes.
Mas hoje, no retiro em minha casa,
Eu escuto outras palavras,
Das várias coisas ao meu redor.
E elas falam novamente dele
Companheiro que partiu alhures.
Eis que abro uma gaveta
E toda a cena reaparece:
Sua voz me chamando à mesa
O elogio à toalha florida.
Um abraço e o jantar dos dois,
De um dia qualquer... Rememorado.
E, de repente, outras coisas aqui de casa
Também vêm expressar
Cuidados, risos, conversas...
Gestos, carícias, olhos fechados... Música!
Transmitem falas, acendem saudades.
Até quando elas vão dizer assim,
As coisas da minha casa?
São vozes que passam, já sei bem.
Logo, logo elas se calam
É impossível refazer toda a cena
Seus sabores e prazeres.
Mas, enquanto elas ainda falam,
Quero ouvi-las!
E ver de novo aquela imagem
De um hábil amor passageiro
Que soube deixar mensagens
Nas coisas da minha casa.


Pendant que les choses parlent


Les objets sont toujours plus qu’eux mêmes
Car porteurs des significations humaines.
Parmi leurs multiples sens,
La capacité de parler d’amour.
Que disent-ils d’un bien-aimé?
Quels mémoirs révivent-ils?
Tout d’abord les paysages
Horizon, mer, lune, verts, remparts au loin...
Évoquent les grands moments,
Les grands rêves des amants.
Mais aujourd’hui, retirée chez moi,
Je saisis d’autres paroles
Des petites choses qui m’entourent
À me parler de lui
Compagnon parti ailleurs.
J’ouvre juste um tiroir commun
Et toute la scène réapparaît:
Sa voix m’appellant à table
Sa remarque sur la nappe fleurie.
Un jour quelconque soudain refait!
Um bras autour et un dinner.
Et tout d’un coup, d’autres objets
Eux aussi, à rappeller
Soins, rires, conversations...
Gestes, caresses, yeux fermées... Musique!
Foisons de voix, nostalgies de lui.
Jusqu’à quand parleront ainsi
Les choses de ma démeure?
Ces voix sont éphémères, je le sais!
Bientôt elles seront en silence.
Inhabiles de réfaire toute la scène
Les saveurs et les plaisirs.
Alors, tant qu’elles parlent, les choses!
Je veux leur entendre
Et revoir ainsi l’amour
D’un habile passager
Qui a su laisser des messages
Dans les choses de mon foyer.


Por que demora, a dor de um coração partido?

Primeira resposta: dura tanto quanto o amor foi grande.
Mas não é só isso, tenho certeza!
Hoje de manhã, limpando o quarto,
Uma lâmina fina de madeira caiu de um canto.
Surpresa!
Ela esperava, ainda, aquele que eu amara.
Resto de um de trabalho por ser feito
Um pedaço de plano inacabado.
Há dois anos guardado,
Hoje essa coisa de nada, de repente,
Deixou o lugar esquecido
E me encheu com a presença do amado
E com a consciência da distância.
Assim, entendi mais da resposta.
Por que demora a dor de um coração partido?
Ela vem dos sentidos e sinais
Que foram próprios do amor vivido.
Revi, então, nossas paisagens
A areia, o mar, a estrada, a lua, os caminhos...
Morros ao longe, fogos de artifício, catedral, calçada.
E, novamente,
Madrugadas a nos surpreenderem juntos
Aroma de café, torrada, pão...
Toques de pele...
Revi tudo hoje de manhã, no canto do quarto.
No projeto quase esquecido.
Nosso amor era múltiplo,
Era riqueza, varanda, casa...
Era a cidade dele!
Era a minha cidade!
Desejo e encontros.
E, no entanto,
As belezas não desviaram as travas do caminho.
O diálogo que faltou
O fracasso das palavras...
Uma lágrima,
E as lembranças mais queridas ressurgiram...

Pourquoi dure-t-elle, la douleur d'un cœur brisé?


Première réponse: elle dure d'autant plus que l'amour fut intense.
Mais, pas seulement, j’en suis certaine!
Aujourd'hui, faisant le ménage,
Une fine planche
À demi travaillée,
Glissa de son coin.
L'étonnement!
Elle s’attendait à celui que j’aimais.
Un petit travail resté à faire
Un bout de plan inachevé.
Deux ans passés, un objet mine de rien,
Soudain detaché d’un coin ignoré,
Me remplit de sa présence
Et de la conscience de sa distance.
Et donc, je saisit l’autre partie de la réponse.
La douleur du coeur brisé
Vient de la pluralité de sens, et des signes
Qui furent le propre de l'amour vécu.
C'est ainsi que je revis nos cadres dehors
Le sable, la mer, la route, la lune, les chemins...
Montaignes au loin, feux d’artifice,
Cathédrale, marché
Et encore
L'aube à nous surprendre ensemble,
Odeur du café, tartine, pain...
Touchers de peaux infinis...
Je lui redécouvrit ce matin,
À un coin de chez moi
Petit projet quasi oublié.
Notre amour était multiple, richesse,
Balcon, maison
Était sa ville natale, était la mienne!
Désir de lui
Rencontres et admiration...
Et pourtant,
Les beautés ne surent détourner les travers du chemin.
Le dialogue manquant
L’échec des mots...
Une larme voulut rester
Et les plus chéris souvenirs.

quarta-feira, 11 de março de 2020

Fé cristã e igualdade de gênero


8 de março celebra conquistas históricas das mulheres, que mudaram culturas e sociedades, sempre no sentido de mais humanização e bem-viver. Beneficiaram as crianças, a maternidade, a paternidade, a velhice, a educação, a saúde, enfim, a liberdade humana.
A fé cristã, por sua vez, defende a igualdade entre os gêneros, expressão dos desígnios do Criador, que fez mulher e homem “à sua imagem e semelhança”. O apóstolo Paulo explicou bem esse ponto na Carta aos Gálatas. Ele disse:
“De fato, todos vocês são filhos de Deus, por meio da fé em Jesus Cristo (...). Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo (...) herdeiros conforme a promessa.” (Gl 3, 26-29) E, mais adiante, ele explicou a “adoção”: “...Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido debaixo da Lei, a fim de resgatar os que estavam debaixo da Lei, de modo que recebêssemos a adoção de filhos. Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: ‘Abba! Pai’. Portanto, você já não é escravo, mas filho. E se você é filho, é também herdeiro por causa de Deus”. (Gl 4, 4-7)
O Evangelho anulou, portanto, toda discriminação, uma vez que através de Cristo fomos adotados. O teólogo Timothy Keller destacou que a adoção, na sociedade daquela época, era uma instituição masculina. Ela funcionava assim: um homem sem herdeiros podia adotar um para quem deixaria seus bens, nome e status social. Ocorre que, pela lei, só homens podiam ser adotados. Nunca uma mulher. Daí o caráter revolucionário da adoção que Deus ofereceu através de seu Filho, a pessoas de diferentes etnias, classe social e gêneros.
Nas nossas instituições humanas não tiramos todas as consequências desse Evangelho. Ao contrário, na construção das igrejas cristãs, houve perseguição e discriminação de mulheres. Na vida civil, a igualdade está longe! Vejam os índices de violência contra mulheres e homossexuais, as barreiras à mobilidade das mulheres nos espaços das cidades, a baixa representação política feminina, as dificuldades de conciliar trabalho e cuidados com os filhos e os idosos, o lugar secundário que as sociedades atribuem aos cuidados em geral. Questionam-se direitos como licença paternidade e maternidade. É difícil fazer valer o princípio da solidariedade. A sociedade é composta por pessoas diferentes em idade, sexo, em necessidades etc. A diferença nos enriquece e cada um tem a colaborar com o coletivo.
Por outro lado,os movimentos feministas inscreveram valores cristãos, seja na lei, seja nas relações interpessoais.
Há desacordos, como por exemplo, o tema do aborto, que movimentos feministas consideram um direito de escolha da mulher. Sem entrar nessa discussão, vale lembrar que há nesse terreno algumas concordâncias básicas: a maternidade, a infância, a educação, a saúde, a informação, são alvos fundamentais de uma sociedade, de um país que defende a justiça. Não adianta condenar o aborto e, ao mesmo tempo, ser indiferente à miséria, à falta de acesso a meios contraceptivos, à cultura, ao cuidado com as crianças, às necessidades das mães e dos pais etc...
Na visão da fé, mulheres e homens foram criados segundo um projeto de liberdade. Houve a queda, mas Jesus inaugurou os novos tempos escatológicos, nos fez Nova Criação. Deixou sua Palavra e nos redimiu na Cruz.
É possível afirmar que, na história da busca pelo Reino – “venha a nós o vosso Reino, seja feita a vossa vontade..., o pão nosso de cada dia” – os feminismos também estão presentes, a despeito de suas grandes diferenças e das discordâncias com elementos da fé cristã. Esses movimentos têm sua quota de participação na feitura do Reino que quebra as correntes do mundo. Lembrando Paulo: “... como podemos querer nos tornar novamente escravos...se conhecemos a Deus e nos tornamos herdeiros"?
Não se opõem feminismo e fé cristã. Feminismo é ferramenta na busca da equidade de gênero, do respeito às diferenças e da paz. Ele se alinha na longa lista de utopias de justiça que tantos povos e culturas formularam, imaginaram e buscaram.

Mensagem a uma lua e a quem me fez conhecê-la

Moço,
Diz à lua de Saint-Pierre
Hoje por acaso cheia,
Que eu a amo,
Que me despeço dela.
Diz à lua de Saint-Pierre
Que quero voltar a vê-la
Se a vida me der a graça
De voltar, de retomar a estrada.
Diz à lua de Saint-Pierre
Da memória de seu brilho.

Descobri-a ao lado teu,
Naquele eterno setembro.
Lua,
Só nesta noite,
Me ajuda a enxugar uma lágrima
Me ajuda a pegar tua luz
Lua de Saint-Pierre
Por favor, diz,
Que ele me deu de presente
O poder olhar para ti,
E te guardar!
Lua de Saint-Pierre
Tenho saudades de ti.
Queria te ver mil vezes,
Seguir mil vezes teus ciclos.
E além disso,
Eu também te queria mostrar
Brilhando no céu da minha cidade,
Ao que tem meu coração,
Coração inteiro, amor que já partiu.
Lua de Saint-Pierre,
Segues à frente dos meus olhos,
Riqueza... tesouro!
Recurso em novos caminhos.
Lua... eu desejo
Que outros amantes
Experimentem teus convites...
E daí deduzam a alegria de viver
Que todo amor confere.
Mesmo um amor passageiro
Como o que vivenciei...
Porque em todo canto do mundo
Onde quer que haja amantes,
És necessária, Lua!
Amantes que partilham o prazer,
Amantes cuja inocência do sonho
Os leva a contemplar o céu.

Para René, 9 de março de 2020.

À une lune et à celui qui me l'a fait connaitre


Monsieur
Dis à la lune de Saint-Pierre
(Elle est pleine ce soir)
Que je l'adore,
Que je lui dit au revoir.
Dis à la lune de Saint-Pierre
Que je veux la revoir un jour
Si la vie m'accorde la grâce
D'y retourner, de reprendre la route.
Dis à la lune de Saint-Pierre
Que sa lueur est gravé sur moi.
Je l’ai découverte à ton coté,
Toi qui me l'a présenté
Au cours d'un septembre éternel.
Lune,
Cette nuit
Aide moi à essuyer une larme
Aide moi à saisir ta lumière
Lune de Saint-Pierre.
Dis lui, s’il te plait,
Qu'il ma donné ce bien inouï:
Te regarder
Et te garder.
Lune de Saint-Pierre
Nostalgie de toi.
Je voulais te voir mille fois
Suivre tes cycles mille nuits.
Et puis,
Je voulais te montrer aussi
Brillant au ciel de ma ville,
À celui qui retient mon coeur.
Coeur plein d'amour manqué.
Lune de Saint-Pierre,
Tu restes devant mes yeux,
Richesse, trésor,
Ressource pour d'autres parcours.
Lune... Je souhaite
Que d’autres amoureux
Éprouvent tes invitations
Et en déduisent la joie de vivre
Que procure tout amour.
Même passager...
Tel celui que j'ai connu.
Car, partout dans ce monde
Là où il y aura des amants,
Tu seras nécessaire, lune!
Des amants partageant la jouissance,
Ceux dont l’innocence
Les amène à chercher le ciel.

Pour René, le 9 mars 2020.