quarta-feira, 30 de março de 2011

Portos seguros

Recebi, nestes dias, dois convites de comemoração de aniversário de casamento: um de vinte e cinco anos e outro de cinquenta. O convite do primeiro tem um bela e expressiva apresentação. A capa traz uma fotografia dos noivos no dia do casamento, super espontânea e, no interior, a foto do casal e dos três filhos. O segundo, de minha parceira de trabalho e de diversas realizações, Luzia Álvares,  feminista com reconhecida produção acadêmica nessa temática e coordenadora do Grupo de Estudos Eneida de Moraes sobre Mulher e Relações de Gênero, na Universidade Federal do Pará. Pois bem, o convite traz uma foto do jovem casal em Mosqueiro, Pedro e ela, numa composição que parece artística: os dois em um barco pesqueiro na praia. Dentre os dizeres, metáforas que exprimem uma bela trajetória de vida, privilegiada.
Nesta viagem que começamos juntos há cinquenta anos, passamos por mares revoltos e espelhos d'água. Em muitos dias o sol brilhou para nós, mas também tivemos a chuva para matar a sede. O pequeno barco em que nós começamos transformou-se em um transatlântico para acolher as filhas, genros e netos (...) Temos sempre um ao outro como um porto seguro.
A instituição casamento, quase universal nas culturas, tem passado por muitas mudanças, expressando as mudanças sociais e culturais. De negócio familiar a expressão do amor romântico, envolveu e envolve muitas definições e redefinições dos papéis dos cônjuges. É o caso, por exemplo, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, hoje na pauta política. Nada mais é comparável à condição da esposa na Casa Grande, cujo tipo ideal foi tão bem retratado por Gilberto Freire, autor que prestou atenção àquelas "figurantes" da economia colonial, sem lugar além de terem sido meio de união entre famílias, clãs e bens.  O tipo ideal não faz referência, é claro, às exceções, aos casos de mulheres que assumiram com mão firme os negócios da família na ausência do patriarca.
Sem as amarras tradicionais que mantinham o contrato de casamento à força, quando a convivência perdera o significado, instituído o divórcio legal, a instituição tornou-se muito mais frágil e exige mais atenção sobre a qualidade dos laços, a serem vividos porque valem a pena, não por hábito, acomodação ou, pior que tudo, por obrigação. Dentre as muitas ameaças, uma perigosíssima a minar uma relação é a incorporação da rotina que extirpa da relação aquele caráter especial que lhe é próprio, o que os casais acima referidos parecem saber manter.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Conselhos policiais 2

Ainda a propósito dos conselhos de segurança para motoristas em Belém. Eles de certo modo espelham nossa estranheza coletiva, que leva quem pode a se esconder, a se camuflar por detrás dos vidros escurecidos dos automóveis particulares. Essa atitude social, essa sociabilidade ao avesso, é também decorrente do modo como ocupamos essa porção do espaço urbano que são as vias de trânsito, com muitos veículos conduzindo poucos e transportes coletivos  conduzindo muitos com margens de segurança perigosamente baixas. Cotejando-se matematicamente a relação superfície ocupada pelo veículo e número de passageiros que conduz, vê-se que nesses espaços públicos as desigualdades são de monta e a democracia no seu usufruto passa longe. Como se sabe, essa contabilidade espacial também explica a naturalidade que se materializa na forma de conselhos emitidos pela autoridade pública para os cidadãos se protegerem da violência. Eles têm seus correlatos nas recomendações sobre horários para sair, cuidado com bolsas, bolsos etc... São como conselhos para a guerra. Mas cujos combatentes inimigos são moradores da mesma cidade. Nestes tempos de paz civil, é muito difícil  admitir que tais conselhos já são parte da cultura urbana.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Conselhos policiais

Com um misto de surpresa e de tristeza ouvi há cerca de dois dias no noticiário televisivo em Belém, um conselho dado por uma autoridade policial referente aos cuidados que se deve tomar ao dirigir na cidade, tendo em vista evitar os assaltos e os sequestros de motoristas, os quais costumam ocorrer, segundo as estatísticas, entre 6 e 10 da noite e atingirem mais frequentemente motoristas mulheres que  homens. Dentre os conselhos de segurança, além do conhecido "não deixar a janela aberta" - fechar-se para o mundo ao redor, contribuir para o aquecimento global com o uso suplementar de combustível para manter o ar condicionado, ampliar o fosso de comunicação entre os incluídos e os "outsiders", dentre os quais jovens malabaristas, pedintes, vendedores diversos... - houve também a recomendação do uso de películas nos vidros. As películas, que frequentemente são mais escuras do que o limite legal permitido, passam a ser consideradas itens de segurança, ao mesmo tempo em que, por outro lado, reduzem a visibilidade do motorista, retiram do pedestre indicações preciosas sobre a direção para a qual o motorista está olhando, com a qual comumente baliza uma decisão de atravessar a rua ou esperar. É claro que as razões dos conselhos são mais do que compreensíveis, muito embora não deixe de ser estranha a concordância oficial com um tipo de atitude que, embora proteja o condutor e os passageiros, como é o caso do uso da película, também acarreta insegurança sob outros pontos de vista. Enfim, trata-se de se resignar com uma  postura que traz um quê a mais de barbárie nas nossas ruas cotidianas, de causas complexas mas identificáveis. Nossa tolerância é grande com a estranheza coletiva do dia a dia!

terça-feira, 15 de março de 2011

ESSES GRANDES EVENTOS DA NATUREZA

Nos últimos tempos somos confrontados com muita frequência a eventos naturais de enormes proporções, com a dolorosa marca de tirar rapidamente milhares de vidas humanas. Só nos últimos dias, os terremotos na Nova Zelândia e no  Japão, cujos sistemas de prevenção e de treinamento da população são celebrados mundo afora, com justa razão; mas a força das águas deixou pouca margem de manobra na zona de influência, de modo que os  alarmes não foram eficazes. Sem eles, pior teriam sido os resultados. 

Esses fenômenos suscitam questionamento e reflexões em vários sentidos. Desde logo, sobre a vulnerabilidade da vida e a instabilidade do praticamente único ambiente até agora conhecido que a tornou possível, a Terra. Ela reúne condições de relativa estabilidade a ponto de possibilitar as reações químicas que engendraram a vida em sua exuberância terrestre. São tênues essas condições, como se vê, e a Terra tem um caráter especialíssimo entre seus pares.
http://cafecomciencia.wordpress.com/2009/06/
http://www.cepa.if.usp.br/energia/
energia1999/Grupo4B/Eneralte/Terra.htm

As placas tectônicas estão a lembrar a   história geológica dentro da qual se inscreve nossa história humana, em uma porção ínfima face ao diâmetro do globo.  Sempre é admirável o que se construiu nesse espaço que parece um "detalhe" no conjunto das proporções planetárias e galácticas. 

Uma parte notável dessa história diz respeito ao conhecimento sobre o meio natural. A confiança no saber e na  autonomia e capacidade construtiva dos homens e das mulheres, com a ciência e a tecnologia,  marcou o que se chamou de modernidade. Visivelmente, chegou-se a níveis de conhecimento e de avanço tecnológico sem precedentes. O saber é cumulativo. Mesmo quando mudanças revolucionárias ocorrem, novos paradigmas teóricos, há sempre a inevitável contribuição  das gerações  passadas, séculos de trabalho e inventividade, a exemplo das construções japonesas que, desde tempos medievais, são estruturadas com determinado grau de mobilidade de modo a resistir a terremotos.

Diversos analistas têm criticado a falta de limites nas obras humanas, em desacordo com os conhecimentos ambientais de que se dispõe. Não há responsabilidade social  sobre terremotos, tal como pode haver sobre o aquecimento global. Mas, é  evidente o  pouco cuidado na gestão da ocupação e dos usos ambientais. São as ocupações  em encostas, empreendimentos  em áreas de riscos, mangues e matas ciliares derrubados, pesca predatória etc. Assim, é igualmente notável que tudo o que se sabe hoje sobre o meio ambiente, inclusive o que se sabe sobre a ignorância  humana frente à complexidade do "mundo natural", enfim, esse crescente conhecimento não se acompanha de maior capacidade adaptativa às coerções do meio. 

E nesse sentido, vale a pena lembrar algumas abordagens críticas sobre a modernidade que acentuaram seu caráter paradoxal. De um lado, a liberdade propiciada pela razão e pelo trabalho e, de outro, a prisão às formas e padrões construídos, autonomia e heteronomia caminhando juntas na história. Os filósofos Adorno e Horkheimer, no Texto Dialética do Esclarecimento, argumentaram sobre o que movia a busca do conhecimento  na sociedade capitalista: O que os homens querem aprender da natureza é como aplicá-la para dominar completamente sobre ela e sobre os homens. Assim, concluíram: De meio de emancipação humana, pela capacidade de saber, de razão, ele gerou seu contrário, a sujeição humana a forças impessoais. Não mais a forças sobrenaturais, da superstição ou da tradição, mas a forças sociais... 

Os eventos levam a repensar a segurança dos bens e a relativizar as representações culturais e teóricas sobre a vida social globalizada. A economia virtual ligada em redes, como bem discerniu Manuel Castells no livro A Sociedade em Rede, depende sempre de uma base física e pessoal. Diante da visão dos equipamentos e bens destroçados e dos problemas da energia que as cidades japonesas hoje enfrentam, as notícias sobre os índices Nikkei e as cotações de mercado da Nissan e da Toyota, parecem referir-se a outro mundo. As contas  relacionadas se fazem para trás, os prejuízos exponenciam. As diferenças sociais violentamente anuladas nas filas para obter alimento - exceto pelas porções desiguais de comida servidas a homens e mulheres, segundo os noticiários - dizem algo sobre nossos pressupostos, crenças e valores.

Neste momento, dá vontade de fazer a pergunta ingênua: se a vida é tão fugidia, uma vez perdida não tem volta, por que matamos tanto? E por que negamos a tantos, os meios de viver a vida em plenitude?

Acréscimo em 23 de fevereiro de 2013: 
Numa perspectva espírita, a vida é um intervalo de trajetórias humanas feitas de encarnações e desencarnações, numa linha que tende para cima, para uma evolução, para um progresso na realização das potencialidades previstas por Deus para seus filhos e filhas. As experiências da vida encarnadas são únicas, supremas, acarretam para o espírito em evolução responsabilidades sobre as quais não há como fugir. Nesse sentido, é sempre uma experiência sublime, única, dádiva associada a dever. O cumprimento do dever e a honra à dádiva recebida implicam tanto a busca de melhorar a si próprio, quanto a obrigação de intervir para melhorar o contexto, o bem para seus próximos e distantes. Mas é uma lição extremamente complexa de ser entendida. Das encarnações nada levamos fora o que contribui para a evolução espiritual. Mas são os interesses materiais e o apego à materialidade que ocupam o centro das preocupações. Daí nosso "pouco caso" pela vida comum; guerras sobrepujando a paz, concentração da riqueza comum em vez da preocupação com a sorte dos semelhantes. A morte banalizada. Vida que, ao contrário, é feita de múltiplos tempos e espaços, dádiva e dever, presente e responsabilidade de todos e de cada um.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Sobre a comunidade brasileira na Guiana

Dados de 2005, analisados  por Stéphane Granger*, davam conta de que  os brasileiros representavam cerca de 10% da população da Guiana.   
Eram sobretudo migrantes "econômicos" conforme a classificação
comentada na postagem de 9 de março. 
Essa imigração teve início com a construção do Centro Espacial de Kourou,  
quando as autoridades francesas, diante da escassez de mão de obra local, 
recrutaram, a partir de 1964, centenas de brasileiros, que em grande parte 
ficaram na Guiana após o fim do contrato. 
A eles foram se juntar milhares de outros compatriotas. 
Uma operação franco-brasileira de repatriamento, em 1974, fracassou. 
 
Os migrantes brasileiros estavam atrás em número apenas dos haitianos
e se caracterizavam pelos seguintes aspectos, segundo Granger: 
- intenção de permanecer apenas o tempo de amealhar um pecúlio 
e voltar para casa;
- mesmo após uma expulsão, muitos retornavam à Guiana;
- reputação de saberem "se virar" e de serem qualificados marceneiros, 
carpinteiros navais, mecânicos, eletricistas, garimpeiros, pescadores, 
artesãos, cozinheiros e em trabalhos diversos (neste caso sobretudo 
aqueles em situação irregular);
- as mulheres, segundo dados oficiais, tinham taxas de ocupação inferior 
às dos homens e sofriam mais com o desemprego; 
- como no Brasil, a declaração de estar desempregado não impedia 
de trabalhar "no que der certo".
 
Segundo a analista, um forte individualismo marcava essa comunidade
brasileira que se considerava de passagem na Guiana. Assim, seus 
membros procuravam alcançar seus objetivos e 
ir embora, o que redundaria em certa ausência de solidariedade. 
Os haitianos, ao contrário, caracterizavam-se por solidariedade de grupo
e uma densa rede de associações. 
 
* GRANGER, Stéphane. La population brésilienne en Guyane, entre affirmation
et intégration.
Revue Guaiana, Spécial Brésil. Novembre 2005.

quarta-feira, 9 de março de 2011

O mato amazônico passou e a banda não viu


A fala lapidar do prefeito de Manaus há duas semanas, justificando a tenacidade de uma moradora em permanecer em área de risco pelo fato de ela ser paraense, foi campeã de reações nas redes sociais. Hoje, outra fala sobre a região bombou no Twitter. Foi durante a entrevista concedida pelos membros da banda jovem Restart, quando um deles disse que gostaria de tocar no Amazonas, porque era "só mato, não sabia se tinha muita gente, civilização...". Dentre as reações, uma bem humorada dizia que então ele queria tocar para a "mãe natureza" e não para uma audiência! 

Lances assim, que ainda são frequentes, surpreendem não só porque retomam imagens muito antigas de uma Amazônia exuberante, embora pobre em sociedades. Também, porque ilustram que no Brasil há grande desinformação, ou pouco interesse, quanto à realidade quotidiana nestas paragens. No caso, trata-se dos níveis alarmantes de desmatamento. Nesse ponto específico, seria bom se a imagem correspondesse à realidade. Mas o "mato" está cada vez mais ralo; não propriamente para o bem do seu público.

http://ecourbana.wordpress.com/2008/06/05/desmatamento-na-amazonia-cresce-775-em-um-mes/

AMAZÔNIA FRANCESA; TÃO PERTO, TÃO LONGE

O Brasil não conhece a África
mas a Àfrica sabe bem o Brasil...
Essas frases da música de Gonzaguinha vêm em razão de uma recente viagem que fiz a Cayena, junto com uma cara colega, Edma Moreira, para apresentar um trabalho em co-autoria com Jean Hébette, no Colóquio Patrimonialização e Desenvolvimento, promovido pela Universidade das Antilhas e da Guiana (http://www.colloque-patrimonialisation-guyane.com/colloque-Patrimonialisation-Guyane/Bienvenue.html). Desde os procedimentos iniciais para tirar o visto, quando constatei que brasileiros precisam de visto para entrar na Guiana, embora não para fazer turismo na metrópole, tive a impressão de que a maioria de nós, no Pará, conhecemos pouco, ou quase nada da vizinha Guiana, apesar das ligações históricas do passado. Por outro lado, aprendi que dentre os países que fazem fronteira com a França, é com o Brasil que ela divide sua fronteira mais extensa: 730km.

No entanto, muitos dos que lá vivem conhecem alguma coisa do Brasil, e da Amazônia em particular. Digo isso, em primeiro lugar, porque os professores com os quais conversamos quase todos tinham vindo mais de uma vez ao Brasil, para passear, fazer pesquisa, fazer compras ou participar de evento. A propósito, uma pesquisadora da área de Biblioteconomia na cidade de Cayena, que disse conhecer "Mosqueiro, Icoaraci, Belém, Manaus, estados nordestinos etc." fez uma reflexão peculiar sobre nós outros. Ela considera que os brasileiros têm uma maior integração ao ambiente natural, comparativamente aos seus conterrâneos, a exemplo a quantidade de frutas  regionais que se aprecia no norte e nordeste do Brasil, enquanto que em Cayena eles se voltam muito à França, consomem mais as coisas que vêm de lá e, portanto, não valorizam seus recursos naturais como nós, brasileiros, aparentemente fazemos. Mas, ela também vê uma analogia entre essa relação deles com a metrópole e a atitude "brasileira" de sobrevalorizar o que é do sul e sudeste do país. 

Em segundo lugar, há muitos brasileiros naquele território francês de além mar, imigrantes "legais" e "ilegais", assim como chineses, vietnamitas, surinameses, haitianos... a ponto de formarem grupos reconhecíveis. Os chineses visivelmente concentram inúmeras lojas nas ruas do centro comercial de Caiena. Os brasileiros, em sua esmagadora maioria amapaenses e paraenses, são comumente recepcionistas ou arrumadores em hotéis, garçons, ou atendentes em lojas. Trabalham também na construção civil. Na zona rural, são muitas vezes garimpeiros. Vi uma loja de compra de ouro em Cayena com inscrições em francês, português e duas outras línguas. 

Ao que pude perceber, a Guiana, sobretudo desde as duas últimas décadas, vem valorizando sua composição multicultural, pelo menos em discursos públicos. Assim consta no pequeno livro Guyane, l'incroyable guide, do Comitê de Turismo da Guiana (www.tourisme-guyane.com), que traz na sua primeira página: "Bem vido à Amazônia Francesa". O guia tem uma seção intitulada: "A incrível diversidade dos povos", fazendo referência aos ameríndios, aos Hmongs originários do Laos, e aos Bushenengués descendentes dos escravos revoltados , grupos aos quais correspondem tradições, uma arquitetura e um artesanato original. As seguintes linhas arrematam o texto: "Com seus 190.000 habitantes, a Guiana é um caleidoscópio de etnias, majoritariamente instaladas sobre o litoral, que dão um raro exemplo de concórdia e convivialidade". Belos  e importantes dizeres em uma conjuntura que é de inquitetude e embaraço por parte dos governos da União Européia frente às levas de migrantes que deixam a Líbia, o Egito e a Tunísia teimando em cruzar o Mediterrâneo em fuga dos problemas políticos; entre eles acha-se uma parcela de migrantes "econômicos", ao ver dos responsáveis políticos, pessoas que "aproveitam a oportunidade para ir trabalhar na Europa", dizem

É, portanto, pena a ausência de maior intercâmbio - comercial e cultural - entre os territórios que partilham a Amazônia, histórias com muitos pontos em comum, assim como diversidade cultural. Claro que há trocas, um contínuo vai e vem de populações, especialmente em busca de meios de vida, mas evidentemente sem a visibilidade do turismo de massa, oficialmente registrado. Entre Belém e Cayena são menos de duas horas de avião, mas há só um vôo semanal. No vôo que fizemos saindo de Macapá era grande o número de assentos vazios. 

É também pena que, assim sendo, não  haja estímulos ao turismo interregional, inclusive para aprendizado da língua francesa e, no caso, da língua crioula francesa. A propósito, uma das expositoras, professora da área de literatura, apresentou um programa recente nos diferentes níveis de ensino público em Cayena, que pretende introduzir nos currículos escolares conhecimentos sobre os povos que formaram a sociedade guianense, suas culturas, arte e história. Intercâmbios sobre experiências de valorização multicultural em áreas periféricas nos respectivos contextos nacionais, são muito oportunos.  Exemplo,  o reconhecimento dos territórios dos povos remanescentes de quilombos,  ou então as reservas de proteção ambiental com garantia de direitos aos habitantes tradicionais, importantes lá e cá. Essas experiências podem ser interpretadas como re-escrituras das histórias coloniais, desta feita a partir das realidades socioculturais locais.