Vivi a transição entre a máquina de escrever - fiz curso de datilografia aos 16 anos, em um curso chamado TED ("tempo é dinheiro"!) - e o computador, o que me rendeu até hoje a facilidade de digitar com os dez dedos e poder, inclusive, conversar ao mesmo tempo em que digito. Devo isso ao TED.
Assim, cedo me acostumei a escrever meus textos a lápis e depois datilografar. Que complicado era corrigir ou alterar um texto já digitado! Inimaginável o corta e cola de hoje! Outro mundo! Além disso, eu não achava possível escrever um texto diretamente na máquina, mesmo a elétrica IBM, o suprasumo da rapidez na digitação, com fita corretiva, que começava a exibir incríveis memórias de várias linhas ou página inteira. A Olivetti competia com a IBM nesse mercado. Para mim, a primeira versão com o lápis e a borracha era uma etapa indispensável da criatividade. Não imaginava que bem pouco tempo depois essa ordem de trabalho seria suplantada pelas facilidades do editor de texto no computador.
Nessa época, final dos 80, essa linha de inovações maravilhosas que levaram da máquina manual às elétricas foi brutalmente interrompida. O computador pessoal começou a se popularizar. Não era mais restrito às grandes organizações e a conhecedores do sistema DOS, que parecia tão misterioso com suas profusões de palavras e códigos em uma tela escura. Lembro de quando prestei exame vestibular e fora advertida ao longo do ano pelos professores, sobre o cuidado que deveria ter ao marcar o cartão de respostas que seria lido pelos computadores, máquinas tão grandes quanto distantes.
O impulso extraordinário para a popularização foi dado com a interface amigável e o reduzido tamanho dos primeiros Macintosh, bonitinhos, fofinhos. Seus recursos visuais bem humorados e o fato de reunir na mesma caixa a tela e o motor, começaram a redesenhar nossa relação com o computador, com o trabalho e com a vida de uma maneira geral, pois iniciava então a grande alteração na distribuição do nosso tempo diário entre o trabalho e a vida pessoal. O computador entrou nas casas para ficar.
Enquanto estive na França, em cujas instituições de ensino o Mac conhecia grande expansão, não tive problemas de assistência técnica. De um lado, a máquina robusta praticamente não apresentava defeitos. De outro, colegas brasileiros da área da informática nos repassavam as últimas novidades. Outra característica de nossa era ia se firmando, a das inovações constantes e compulsórias, a exemplo dos anti-virus e das novas facilidades de programas. A dificuldade foi ao voltar para Belém, em que o número de usuários Mac contava-se em unidades. Quando meu primeiro computador começou a dar os primeiros sinais de cansaço, com cinco anos de vida útil, a peregrinação em Belém junto a técnicos conhecedores da marca não foi fácil. Por essa época, a Microsoft já conquistara o mercado com seus PCs, colhendo o sucesso da abertura do sistema Windows para diversos fabricantes, o que não acontecera com a Apple. A chave para a persistência no Mac era, então, o fato de que seu uso continuava muito mais fácil do que o PC e menos vulnerável aos vírus. Enfim, era uma questão de ser fã da marca. Quem estava habituado ao seu sistema operacional achava irritante usar um PC. Até hoje uso um Mac. De vez em quando ainda peno para converter algum texto que recebo. Mas as vantagens superam esses probleminhas. E os sistemas hoje conversam muito mais entre si.
Em uma viagem ao Québec em 1997, tomei conhecimento de uma "associação de amigos do Macintosh", evidência de uma ligação à marca que ia além da funcionalidade ou gosto. Testemunho da singularidade e do gênio de Steve Jobs, uma aura que Bill Gates, seu maior concorrente, não conseguiu copiar, embora comercialmente a Microsoft tenha superado de muito a empresa do antigo companheiro de invenções.
Minha familiaridade precoce com a máquina me rendeu uma primeira reprovação em um teste de emprego como secretária de escola. No processo de seleção, na prova de datilografia coloquei o papel carbono virado ao contrário. Assim, digitei super rápido o texto solicitado, crente que estava abafando. Ao terminar de digitar, quando fui entregar as duas folhas ao examinador, vi uma totalmente em branco e a outra digitada na frente e no verso; a expressão do homem mostrava que minha carreira naquela escola abortara.
Atravessei os anos de faculdade com o costume de escrever à mão e, posteriormente, na máquina. Assim, quando fui para o doutorado em 1988, quiz muito levar uma máquina elétrica IBM na bagagem. Ainda bem que não o fiz. Logo seria apresentada ao Mac.
Superei a angústia de pensar em pagar a alguém para
digitar meus textos e meu quase arrependimento de não ter
levado comigo a utilíssima máquina elétrica, de toque macio. Meu marido e eu metemos a cara na compra de nosso primeiro
Mac, em 1989, ainda bastante caro. Mas que conforto! Ao ligá-lo todos os
dias, a visão da carinha de um computador sorrindo no meio da tela,
indicava que tudo ia bem no sistema. Ufa! No início eu tinha sempre um pouco de medo de
que aparecesse o ícone do computador triste, sinal de defeito e, também, uma sensação de abandono. E a urgente necessidade de recorrer a um especialista em
computação para recuperar a capacidade produtiva, cada vez mais
dependente da saúde de um computador e da disponibilidade de um anti-virus atualizado.
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