Achei um grande deleite o filme Árvore da Vida. Sendo um filme econômico em falas, dá margem para o espectador elaborar sua própria reflexão e atribuir sentidos, ao mesmo tempo em que segue a narrativa. Por isso senti o filme como se fosse uma viagem por temas que, no fundo, nos interpelam a todos. De um lado, o filme mostra flashes da vida de uma família de classe média em uma pequena cidade, ou subúrbio americano na década de 1950, através das memórias do filho mais velho, já adulto. Sua vida adulta, de profissional bem sucedido, passa-se em uma grande cidade da qual apenas se vê a uniformidade das fachadas em vidro dos edifícios, altíssimos, dando idéia de ambientes ascéticos, puramente funcionais, orientados para a racionalidade tecnológica e econômica. Nada mais é dito sobre o contexto. Nesse ambiente, ele reflete sobre a superficialidade da vida presente. Esse quadro urbano contrasta com o ambiente da sua infância, onde se desenrola a maior parte da trama, cheio de árvores, meninos brincando, cenas do lar, da mãe brincando com os filhos, escola, jardins, quintais, cachorros e gatos, beira de rio, uma aprazível quietude, as muitas lembranças marcantes da infância, inclusive o episódio da morte precoce de um amigo. Não aparecem muitas relações para além do círculo familiar.
De outro lado, viaja-se nas muitas imagens da Terra e do espaço, que vão da formação de células primordiais aos confins do universo. Músicas suaves convidam o espectador a se deixar levar e impressionar com a imensidão dos processos da natureza e, ao mesmo tempo, a pensar sobre vida, sobre tempo, o tempo cósmico e os tempos geológicos. A notar as passagens sobre os dinossauros - por vezes arrancaram risos na platéia - que se inscrevem nessa linha de enfoque sobre o tempo. Gostei particularmente das sequências que focalizam vidas embrionárias. Nesse turbilhão, a trajetória de uma família e os laços com pessoas queridas, sobretudo as que se foram. Foi inevitável a pergunta: temos um lugar especial nessa arquitetura imensa, pelo simples fato de desenvolvermos a capacidade de interpretá-la, de nomeá-la e classificá-la dentro de complexos esquemas de valores?
Esse conjunto de cenas são embaladas por falas curtas que a mãe dirigiu aos filhos, ou escutou de professores, sacerdotes, conselhos sobre amizade, amor, Deus, trechos de orações, trechos bíblicos e questões sobre nós outros, no cosmos. Por vezes a música silencia e sons naturais de ondas e de erupções vulcânicas e solares completam a percepção da grandiosidade universal. As palavras da mãe são sentidas de forma mais aguda pelo fato de que, logo ao início do filme, um carteiro traz-lhe a notícia que o filho do meio (de três filhos) acabara de falecer, aos 19 anos. As perguntas que ela lança sobre onde ele estaria, as palavras que endereça ao filho em algum lugar, assim como as questões que o protagonista se faz, são temas muito humanos. Pode-se dizer que são temas universais no contexto das sociedades modernas, que "desencantaram" seus cosmos, notadamente através dos conhecimentos científicos e tecnológicos para perscrutar a natureza, mas não suprimiram as incertezas e as incógnitas.
É possível que o filme envolva elementos da biografia de seu realizador, Terence Malick, uma formação religiosa rígida, a relação tumultuada com o pai autoritário, envolvido em alcançar sucesso profissional como técnico em uma indústria, mas tendo sufocado uma vocação para música. E, de repente, desempregado. Sua figura é oposta à da mãe, lembrada como a amorosidade em pessoa. Imersa no cotidiano familiar e o amor aos filhos, ela se conecta com dimensões profundas da existência.
Os ângulos de filmagem dos personagens são muito próximos dos rostos e dos gestos, de uma notável beleza. Mesmo que algumas vezes eu achasse que o filme estava demasiado longo, além da ausência de uma sequência claramente estruturada, ainda assim é uma grande viagem. Uma viagem exterior e interior, abordando questões e inquietações humanas com uma magnífica técnica. Assim eu vi o filme.
Gostei muito do filme. E do seu post.
ResponderExcluir