Pela filha de uma colega de trabalho, soube hoje de uma prática comum em uma boite de Belém. Não sei se o mesmo se dá em outras do gênero, pois meu conhecimento da vida noturna na cidade é limitado. É uma boite considerada hoje um point de jovens da elite. A casa anuncia, como muitas outras na cidade, que as mulheres, se entrarem até uma certa hora não pagam. Já vi propaganda estendendo esse mimo a estudantes. Esse tipo de "discriminação positiva" é antigo e, na gozação, costuma-se falar que "mulher e cachorro não pagam". Até aí, tudo muito conhecido, herança de tempos em que as mulheres não tinham acesso ao dinheiro, mantida na atualidade por interesse de mercado. E, é claro, uma proteção bem aceita pelas beneficiárias, sobretudo em uma fase da vida em que geralmente a grana é curta, depende de mesadas ou da boa vontade dos pais em pagar a conta da balada.
Contudo, a dita boite inovou na proteção extra e, a meu ver, escorregou para uma discriminação. Para o ingresso gratuito das jovens até a hora determinada, há uma organização prévia, na forma de uma lista na internet, onde a interessada pode colocar seu nome de modo a facilitar a identificação na porta. Vale ressaltar que, caso ela não queira enfrentar a fila e correr o risco de esgotarem os lugares gratuitos, é sempre possível comprar ingresso, como fazem os frequentadores homens. Caso queira o benefício, a lista é recomendável. Mas, como a procura é grande, forma-se longa fila na porta, que permanece grande mesmo depois da hora limite para a gratuidade das moças. Aí, então, é que mora o perigo. Um grupo de rapazes bem vestidos seleciona na fila as moças consideradas "bonitas" e as convida a entrar por uma porta reservada, longe das vistas do público que se espreme do lado de fora. Imagino a sensação das não escolhidas, bem vestidas, maquiadas, animadas... ao serem preteridas por tal critério. Não é racial, não é de gênero, não é étnico. É pelo velho critério da "boa aparência" que costumava estampar tantos anúncios de emprego. Tudo muito sutil, discreto, segundo minha fonte.
Talvez por inexperiência na noite belenense, a prática me deixou estupefata. Mais ainda por constatar que isso não incomoda tanto aos jovens clientes que vão gastar seu dinheiro em uma casa que, ao agir assim, não os respeita como pessoas. Discriminando a uns, atinge a todos pois cria um critério de separação totalmente arbitrário. Já não bastam as muitas seleções prévias na sociedade para que se possa chegar até ali, pagando ou se beneficiando da gratuidade oferecida. O critério de escolha das bonitas é pessoal, dependendo do "olho" dos funcionários que discretamente fazem seu trabalho. Um pouco de burocracia, com suas regras formais e impessoais seria um avanço, pois igualaria as oportunidades e faria valer o anunciado: até a meia noite, mulheres não pagam. Chegando-se depois, vale a outra regra, a do pagamento.
Por que um grupo de pessoas sensíveis não aciona judicialmente a casa por discriminação? Talvez o prestígio, a qualidade dos shows e, portanto, o privilégio de estar entre os eleitos encobre o senso crítico. Seus frequentadores aceitam as regras do jogo pois concordam quanto ao valor do que procuram. A reação teria de vir de fora, como acontece quando vizinhos interpelam casas noturnas por poluição sonora. Ainda bem que a noite de Belém tem outros charmes!
Mª Cristina, as histórias sobre a noite de Belém me tiram do sério. Fico indignado como essa "cultura" de badalação leva as pessoas a práticas tão excessivas e despropositadas. Mas errado está quem desaprova...
ResponderExcluirAnote aí, para elucubrações futuras, a questão da bebida gratuita para mulheres, nos forrós, pagodes e convescotes do gênero. A intenção declarada é embebedar as mulheres para que os homens possam pegá-las mais facilmente, coroando a noite com o êxito-mor do sexo do qual, talvez, ela nem se lembre direito no dia seguinte.
É o tipo de coisa que, a meu ver, depõe contra a ideia de civilização. E ainda por cima é uma antessala de crimes variados. Triste.