domingo, 4 de março de 2012

Um cotoco no trânsito


Desde que pintaram, ou avivaram faixas de pedestre longe de semáforos em Belém, procuro parar ao ver pessoas esperando para atravessar na faixa que, por definição, é prioritária para elas. Talvez essa atitude não seja sempre prudente, porque muitíssimos motoristas não estão acostumados com a medida. Só mesmo na Duque de Caxias e na frente do aeroporto é que elas funcionam. Senão, corre-se o risco de levar uma batida por trás. 

Na Avenida José Bonifácio, no Guamá, onde passo com frequência, no trecho entre o cemitério e a Barão de Igarapé Miri, nos horários de pique, tenho a impressão de que não dá tempo de os pedestres atravessarem no sinal, pois são cruzamentos de ruas de mão dupla e o tráfego é pesado. Fico admirada de não haver maiores reações dos pedestres, pois é um desafio cotidiano. Só quem lá vive e "está acostumado a ser maltratado e a não ter direitos", como diz a música, passa com aparente familiaridade por aquelas ruas.

E no nosso trânsito do dia a dia, aprendi mais uma vez que é melhor não responder a agressões. Há dois dias, parei no sinal aberto para mim, logo ao dobrar vindo de uma transversal para entrar na José Bonifácio, pois havia uns três pedestres atravessando na faixa. Como o sinal acabara de abrir e o meu era o primeiro carro no sinal, eu poderia ter concluído a curva e seguido na avenida. Os pedestres, que já haviam cruzado metade da via aproveitando o sinal que fechara para os carros da José Bonifácio, ficariam esperando no meio, a chance para completar a travessia. Mas eu resolvi parar antes da faixa até que concluíssem. Aí, os carros que vinham atrás de mim devem ter ficado zangados, pois o tempo de sinal verde para aquelas transversais é curto. O motorista de um taxi que vinha logo atrás, especialmente irritado, então, meteu a mão na buzina. Permaneci impávida, pois os pedestres já se adiantavam para concluir a travessia. Deu tempo de passarmos pelo sinal ainda aberto. 

Pois bem, no meio do quarteirão logo adiante, outra faixa, desta vez longe do semáforo, com gente para atravessar. Parei. Eis que nova buzinada veio insistente, do mesmo carro. Subiu-me uma irritação inesperada, que me levou a um gesto conhecido: acenei indicando que o motorista devia avançar, mas evidentemente não havia lugar para tal; um gesto que se traduz por "passa por cima!". O gesto durou segundos e, ainda aguardando os passantes, meu olho alcançou o retrovisor lateral e, naquele breve instante, vi a cara do sujeito a me lançar, junto com um olhar que era o exato contrário de simpático, um cotoco! Um cotoco?! Ai! Alguém que talvez nunca tenha me visto me mandou para aquele lugar sem a menor cerimônia!! Senti tanto a agressividade da cena que tremi e me arrependi, com medo que o indivíduo parasse e viesse me dizer o exato contrário de um elogio, com sobras para a reputação da minha mãe. 

Não sirvo para responder provocações no trânsito. Minha atitude também foi grosseira em certa medida e não aguentei o troco. O certo é desconhecer. Eu estava no meu direito e no meu dever. E, sobretudo, o nível de estresse no trânsito não está para brincadeiras.

Eu quis escrever essa postagem porque acho uma grande pena que o programa de retreinamento de motoristas ao renovarem suas carteiras, com obrigação de assistir aulas de educação no trânsito e direção defensiva deveria ser reforçado, não enfraquecido e substituível por uma prova. Desrespeito, sentimento de superioridade no volante, egos exacerbados, pressa que se descarrega sobre os outros, tudo isso é alvo de reflexão nas aulas. De cinco em cinco anos, relembrar antigas lições, com professores aptos a adaptá-las aos novos tempos de trânsito cada vez mais complicado, acho que faz falta.


Nenhum comentário:

Postar um comentário